domingo, 25 de outubro de 2009

GRAN TORINO


“Um respeitável compêndio da obra de Clint Eastwood, síntese dos acertos – e alguns erros – do diretor com 50 anos de carreira. Mais uma vez o cineasta emociona com sua interpretação cativante e direção segura nesta história sobre um homem que não se adapta aos novos tempos.”

Falar sobre Gran Torino (2008) é o mesmo que fazer um consistente apanhado de todas as obras cinematográficas de Clint Eastwood. Este é um filme que será encarado de maneiras diferentes por dois públicos bem definidos: os que conhecem e os que não conhecem a trajetória do cineasta.
Os primeiros poderão sentir certo ar de Déjà vu, já que há em Gran Torino muitos elementos de trabalhos anteriores de Eastwood: a relação mestre-pupilo e a indisposição com a Igreja (Menina de Ouro, 2004), a redenção do passado violento (Os Imperdoáveis, 1992), as soluções brutais encaradas como formas ultrapassadas de resolver os problemas (Sobre Meninos e Lobos, 2003), entre outros. Porém, após assistir ao filme mais uma ou duas vezes, percebe-se que a presença de tais elementos não diminui o filme do ponto de vista criativo, mas ressalta o amadurecimento do diretor no tratamento de seus temas preferidos. Nesses momentos Eastwood dirige e atua com uma paixão que raramente se vê, paixão que está estampada em seu rosto, desde a cena inicial da missa fúnebre até o surpreendente desfecho.
O restante do público, os que não tiveram a oportunidade de conhecer os outros filmes de Eastwood, terá em Gran Torino uma síntese de tudo o que consagrou o cineasta. Esses espectadores, sem dúvida, serão os grandes beneficiados, já que experimentarão o melhor do icônico diretor de 78 anos em sua fase mais madura.
O veterano de guerra Walt Kowalski (Clint Eastwood) está na igreja, no velório de sua esposa, encarando a multidão. O seu rosto toma toda a tela, o desgosto por ver o desrespeito dos netos durante a cerimônia é expresso com um rosnado. Fica claro que o velho está perplexo com os rumos que o mundo tomou; enquanto isso, seus filhos discutem sobre o que fazer com ele, agora que está sozinho. Logo descobrimos que Walt vive deslocado no tempo, preso a sua própria época, com seus anões de jardim, seu Ford Gran Torino 1972 e sua bandeira hasteada na varanda, onde passa os dias com sua latinha de Budweiser na mão destilando seu desprezo pela vizinhança de imigrantes que, em sua maioria, não sabe falar Inglês.
Falar sobre os desdobramentos do filme a partir daí seria entregar a história, e talvez seja este um dos pontos fracos de Gran Torino: a previsibilidade. Aos 25 minutos de exibição, logo após a cena da briga no jardim, fica evidente o rumo que as coisas tomarão; assim que surgem indícios de que o coração do velho ranzinza não é assim tão duro, pode-se adivinhar o que vem a seguir. Resta-nos, então, apreciar as soluções encontradas por Eastwood para renovar um tema já tão desgastado e, acredite, são ótimas. Se há outro revés a apontar talvez seja a escolha do ator estreante de origem tailandesa Bee Vang para interpretar Thao Vang Lor, um dos personagens centrais. Em muitos momentos-chave, especialmente próximo ao desfecho, o garoto simplesmente não dá conta do recado e acaba ofuscado pela atuação sólida de Eastwood.
De resto, Gran Torino é irretocável. Ver o velho ator de 78 anos em cena é um deleite, não há como não vibrar com a figura de Eastwood, de cara amarrada, pondo em seu devido lugar as súcias de delinqüentes juvenis. E, exceto por uma única cena, nada é resolvido no tapa: o diretor chegou num nível de sofisticação que dispensa esse lugar-comum. A simples presença de Walt é ameaçadora, é difícil até para o espectador encará-lo nos olhos sem se assombrar.
Mais uma vez Eastwood acerta quando escala a si próprio para protagonizar sua obra, o papel lhe caiu tão bem que fica difícil imaginar outro ator encarnando Walt Kowalski. Ao contrário de Keanu Reeves e James McAvoy, Clint Eastwood precisa apenas do indicador e do polegar para impor respeito.

4 ornitorrincos!

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