terça-feira, 26 de maio de 2009

Partida de um amigo querido

Não houve um post nessa semana devido à morte do Saci, nosso querido animalzinho, no sábado passado, dia 23. Naturalmente não tive cabeça para sentar ao micro e escrever coisa alguma. Ficamos muito abalados, e só hoje decidi registrar aqui o acontecido.


Ontem o veterinário nos entregou o corpinho, que eu enterrei no nosso terreno da rua Manaus. Sobre esse evento eu escreverei em breve.
Fique registrada também a chegada da Ricota, nossa mistura de pastor alemão com chow-chow que resultou num pastor de língua roxa. Danielle a salvou de um atropelamento em frente à nossa casa, na quarta-feira passada, dia 20. Ela está sendo muito importante nesse período tão difícil para nós.

domingo, 17 de maio de 2009

Domingo sangrento

Sábado é um excelente dia para instalar tomadas elétricas na cozinha. Isso porque ao contrário dos meados da semana pode-se tomar uma cervejinha e ouvir música alta durante o trabalho. Pois bem, estava eu instalando novas tomadas elétricas na cozinha quando o meu Media Player selecionou aleatoriamente dentre 33Gb de MP3 a faixa “Sunday Bloody Sunday” do U2. Levantei a cabeça para ouvir melhor a música, fios na mão esquerda e na direita a chave de fenda de testes. Que letra foda, foi o que pensei.




E é isso mesmo: uma letra foda, engajada, metafórica, inteligente. Achei graça de quando eu era adolescente no início da década de 90 e ouvia essa música sem fazer idéia do que se tratava, já que minhas habilidades na Língua Inglesa ainda eram medíocres. E ainda assim eu adorava a música, achava a melodia poderosa, dava vontade de gritar junto com o Bono: - Tooooniiiiiiiiight!!! We can be as one!
Anos depois, descobri que a música tratava do massacre ocorrido na Irlanda do Norte em 1972 numa manifestação contrária aos abusos e preconceitos que atingiam a população católica. Tropas britânicas entraram em confronto com a multidão, composta em grande parte por mulheres e crianças, matando pelo menos 14 pessoas e ferindo dezenas de outras. Aquele domingo ficou conhecido como o Domingo Sangrento, que dá título à música.
Conectei os fios vermelho e branco e apertei com a chave philips. Esse privilégio de cantar uma música com orgulho envelhece com a minha geração. O que os moços de hoje dirão, daqui a uns 10 anos, das músicas que ouvem? Pouco ou nada. A enxurrada de hip-hop que inunda as rádios não trata de outra coisa que não seja o traseiro de uma musa anônima que rebola numa boate qualquer, ou então supostas insurreições contra o sistema, ainda que nenhum dos cantores saiba explicar direito o que é o sistema contra o qual se insurgem.
Apertei os parafusos do espelho. Um tomada instalada, faltam sete. Enchi meu peito e cantei desafinado junto com os alto-falantes: “Tonight, we can be as one!”. Esta noite, podemos ser como um. Imaginei, num instante onírico, a multidão de manifestantes enfrentando as tropas britânicas e cantando o refrão: - Tonight, we can be as one!
Enchi-me de orgulho. Minha geração, meus amigos, minha esposa, todos cantávamos e dançávamos ao som de idéias, árias de liberdade. Em uma década duvido que os novos adultos se interessem em saber o que cantavam e dançavam, seja por desconhecer o idioma de Shakespeare, seja por pura vergonha.

terça-feira, 12 de maio de 2009

Manifesto de apoio ao porco

Antes de tudo, é essencial registrar que estamos vivendo uma hipocondríaca moda de “gripe suína” (assim como já vivemos a da “gripe aviária”, da “febre aftosa”, entre outras). Há pouco tempo rebatizaram a tal gripe do porco como “gripe A”, numa tentativa de dissociar a doença do consumo de carne suína. Tarde demais. Nos supermercados as pessoas estão passando longe dos balcões de salgados, temendo que os pedaços de bacon criem garras e voem em suas jugulares.

Estupidez à parte, tratemos do que importa: por que tanto pavor da tal gripe suína se basta sair à rua para verificar que as pessoas não têm cuidado com a higiene, expondo-se dessa forma a tantas outras moléstias potencialmente perigosas, como a meningite, a tuberculose e a própria gripe humana?
Estive em Bangu, sábado passado, para trocar umas roupas que não me serviram e comprar algumas coisas para o dia das mães. A primeira loja que visitamos – minha esposa e eu – foi a Grippon, localizada no centro do bairro. Lá, Danielle comprou algumas bijuterias para presentear minha mãe. Entreguei à operadora do caixa uma nota de R$ 50,00 para pagar as compras e nesse momento a moça, que não aparentava estar muito satisfeita com a sua vida, levou a palma da mão até as narinas e deslizou o antebraço para cima como se uma roldana em suas ventas auxiliasse o movimento. Parou apenas quando o nariz quase chegava à parte interna da junta, deixando um rastro de líquido transparente e brilhante que se iniciara em seu pulso. Limpou a nojeira na roupa e deu o troco nas lindas e asseadas mãos de minha esposa. O sistema imunológico dela daria um soco na cara da atendente se pudesse.
Mais à frente, passando pelo calçadão e indo em direção às escadas rolantes, um sujeito que parecia estar fazendo a segurança da peixaria em frente enfiou uns dois centímetros do seu indicador direito no ouvido e iniciou um frenético movimento circular no eixo do dedo como se quisesse raspar o tímpano com a unha. Ele ria e conversava com os outros enquanto fazia isso. Ao chegarmos à escada rolante, nem Danielle nem eu tivemos coragem de segurar nos corrimões. Sabe-se lá se o sujeito da peixaria ou a operadora de caixa da Grippon passaram por ali.
Finalmente, quando comprávamos alguns ingredientes para o estrogonofe do dia seguinte, no Supermercado Guanabara do calçadão de Bangu, não pude escapar ao meu destino. Uma mulher gorda, mulata, vestida com roupas baratas de péssimo caimento passou à minha direita caminhando mais rápido do que eu. Quando ela tossiu aquela tosse barulhenta e úmida lembro-me de que seus dois braços continuaram fazendo os movimentos alternados típicos de quem caminha, já que a criatura não fizera questão de tapar a boca com a mão. Recebi aquela chuva asquerosa no ombro e no pescoço, enquanto a via se afastar desengonçada e distraída.
O espaço aqui seria pouco para manifestar minha repulsa e indignação. Não me espantaria se, num futuro próximo, para evitar a gripe humana, déssemos com porcos usando máscaras cirúrgicas.

segunda-feira, 4 de maio de 2009

O funeral da arrogância

Eu sempre quis escrever um Blog, mas tinha receio de que seria um total fiasco, que ninguém o leria e que ficaria jogado, perdido no meio das zilhões de páginas inúteis e pouco interessantes que sufocam a rede. Esse risco de ter o orgulho ferido sempre me rendeu certo desânimo.
Para começar a escrever, tive de me despir de toda a presunção, cujo tecido me apertava especialmente na altura do peito e do pescoço. Conformei-me com o fato de que talvez eu mesmo seja o solitário leitor de minhas palavras, e fiz disso a força motriz que impulsionará a escrita: se esse blog será uma espécie de diário, que seja! Nunca fui muito bom em decorar minhas próprias visões das coisas.
E por falar em visão, ela dá nome ao Blog: três por cento. É maios ou menos o quanto enxergo, graças à degeneração causada pela Doença de Stargardt. Nunca fiz drama sobre isso e não começarei hoje: escolhi esse título tão somente porque me pareceu original, e como é difícil ter idéias originais, decidi não desperdiçar essa. Além do mais, enxergar o mundo com baixa visão é algo tão singular que merece ser documentado, e de quebra confere a esse blog um caráter interessante.
Tratarei aqui de quaisquer temas que me despertem a atenção, e não serão poucos: sou um sujeito atento a tudo e a todos. Professor, cinéfilo, nerd assumido, marido e cidadão inconformado, não me aterei a temas específicos, falarei sobre o que der na telha. Na fila das resenhas literárias, o primeiro tema será “Onde os Velhos Não Têm Vez”, que pretendo começar a ler ainda hoje. Bote aí uns 2 meses até sair a resenha, já que leio devagar pacas.

Enfim, se esse blog não receber visitas, estarei resignado. Finalmente tenho uma oportunidade de registrar, em tempo real, impressões datadas de maneira organizada. E aqui vai a primeira: essa vitória que tive sobre minha soberba – o despeito de escrever sem saber se serei lido – soa como libertação. Escrever essas palavras sem a perspectiva de um leitor foi umas das coisas mais arrebatadoras que me aconteceram neste ano.